Portugal, cravo vermelho
Em vinte e cinco de Abril, em Portugal, de repente, no termo da madrugada, floriram cravos vermelhos.
Já quarenta e oito anos a treva nos tinha cegos, quando da treva rasgada floriram cravos vermelhos.
Veio a manha que tardava. Estava a longa noite finda. Num rumor de asas de pombas, floriram cravos vermelhos.
Desde os peitos dos soldados aos peitos dos marinheiros, nas próprias metralhadoras, floriram cravos vermelhos.
Mal rompeu o dia novo, logo por ruas e praças, das cidades às aldeias, floriram cravos vermelhos
Quer nas mãos dos operários, quer nas mãos dos camponeses, no tempo de um pensamento, floriram cravos vermelhos.
Nos olhos baços dos velhos, na gralhada das crianças, no enlevo das mulheres, floriram cravos vermelhos.
Nas páginas dos escritores, na atenção dos estudantes, na comoção da razão, floriram cravos vermelhos.
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Era um povo renascido da morte em que estava morto, cujos gestos e gritos floriram cravos vermelhos
No sol, na lua, no vento... nas searas, nos montados, nos olivais, nas charnecas, floriram cravos vermelhos.
Na voz das fontes e rios, por ondas do mar amigo, nas penedias dos montes, floriram cravos vermelhos.
No pão, no vinho, nos frutos, de sangue e suor nutridos, mais na fome e sede deles, floriram cravos vermelhos.
No azul do céu profundo, no branco leve das nuvens, no canto alegre das aves, floriram cravos vermelhos.
Na sombra vil das prisões abertas de par em par, dos irmãos delas libertos, floriram cravos vermelhos.
Mas no Primeiro de Maio foi que, em todo o Portugal, Portugal todo floriu num mesmo cravo vermelho. Rodrigues, A Manhã Necessária, 1978.
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